Diferencial e árvores de transmissão automotivos

Muito antes do automóvel, o transporte de pessoas era feito através de carroças. Não precisou de muito estudo para perceberem que não era possível que as rodas das carroças fossem ligadas através um eixo inteiriço. As rodas deviam girar livres, para que no momento de fazer uma curva, estas girassem naturalmente em velocidades diferentes, para percorrer raios diferentes. Quando finalmente o automóvel deixou de ser uma utopia e passou a ser real, este problema foi resolvido com um componente chamado diferencial. O diferencial está montado no eixo de tração do automóvel, se a tração é traseira, o diferencial encontra-se na traseira, se a tração for dianteira, o diferencial encontra-se na dianteira. Em casos de tração nas quatro rodas, os dois eixos dispõe de diferenciais, além de uma caixa de transferência entre aqueles.

Engrenagens cônicas hipóides. Repare no tamanho do pinhão, e como ele está montado abaixo da linha de centro da coroa. Crédito foto: http://engineering-references.sbainvent.com/

Dentro do diferencial encontram-se engrenagens cônicas, dos tipos helicoidal ou hipóide, esta última possibilitando a montagem de um cardã mais baixo, motivo pelo qual muitos carros com tração traseira não possuem mais o túnel do diferencial, que invade o habitáculo do veículo. O diferencial transmite o torque motor, que é fornecido longitudinalmente, para as semi-árvores, passando então a ser um torque transversal, e daquelas para as rodas. Cada semi-árvore é aparafusada nas flanges de tração, e estas se apoiam em rolamentos, além de estarem ligadas as engrenagens planetárias do diferencial. São as semi-árvores que possibilitam a articulação da própria, pois caso contrário não seria possível a transferência eficaz torque para as rodas sobre pisos acidentados ou desnivelados. Uma vez que o diferencial conseguiu resolver o problema da velocidade das rodas durante as curvas, surgiu o problema de transferir o torque para a roda que está sem tração. Em diferenciais comuns, mesmo havendo o equilíbrio de transferência de torque, no momento em que uma das rodas perde tração ou tem o seu coeficiente de atrito reduzido, o torque passa a ser transmitido totalmente para essa roda, ou seja, torque em dobro para a roda que está sem tração. Por conta dessa desvantagem, diversos tipos de diferenciais foram desenvolvidos para eliminar essa fraqueza.

Função

Na foto superior esquerda, vemos uma configuração de tração traseira. Na foto inferior direita vemos uma configuração de tração dianteira. Crédito foto: http://www.vapengines.com/

Independente de onde esteja instalado no veículo, as funções do diferencial são as mesmas. Primeiramente, o diferencial recebe o torque do motor através de uma árvore, seja ela o cardã ou a árvore secundária (no caso da caixa de marchas compacta), nestes casos o sentido de giro é longitudinal, ou seja, o diferencial recebe o torque de forma longitudinal. A transmissão desse torque para as rodas é feita pelas semi-árvore, que em relação ao cardã ou árvore secundária, estão dispostas em 90.

Na imagem do canto superior esquerdo podemos observar o diferencial trabalhando como se o veículo estivesse trafegando em linha reta. Ambas as semi-árvores giram a mesma velocidade. Na imagem do canto inferior direito podemos observar que o veículo está contornando uma curva, uma das rodas está girando mais devagar. Perceba que as engrenagens satélites, agora, giram em torno do seu próprio eixo. Crédito foto: http://www.meccanoscene.co.uk/

Dessa forma o torque é transmitido as rodas de forma transversal, ou seja, o diferencial é capaz de transformar o torque recebido em um sentido, e entrega-lo as rodas no sentido destas. As estradas não são 100% planas, um automóvel deve ser capaz de se deslocar por superfícies acidentadas e desniveladas. Entretanto, quando um automóvel passa por um desnível, uma roda pode estar mais alta que a outra, o diferencial deve ser capaz continuar girando e entregando o mesmo torque (vale ressaltar) nesse tipo de situação, ou seja, deve ter certo nível de flexibilidade no acoplamento de suas engrenagens.

Componentes

Bevel Pinion: Pinhão; Pinion Shaft: Árvore de Transmissão; Bevel Ring Gear: Coroa; Differential Gear: Engrenagem Planetária; Differential Pinion Carrier: Engrenagem Planetária; Axle: Semi-árvore; Differential Cage: Caixa do Diferencial; Stud: Pino; * Tradução não segue é literal, e sim para a linguagem utilizada no Brasil. Crédito foto: http://members.rennlist.com/

Um diferencial básico é composto pelos seguintes componentes:

  • Pinhão;
  • Coroa;
  • Engrenagens satélites;
  • Engrenagens planetárias;
  • Caixa do diferencial.

Pinhão

Acima; Coroa; Abaixo: Pinhão. Crédito foto: http://lghttp.14077.nexcesscdn.net/

É a engrenagem que aciona a coroa do diferencial, pode estar ligada ao cardã ou a árvore secundária (caixa compacta). Portanto, o pinhão é a engrenagem motora do diferencial, pois é por ela que o torque motor é transmitido ao diferencial. É cônico e possui dentes helicoidais, fato este que reduz o os ruídos produzidos pelo engrenamento. O engrenamento do pinhão com a coroa produz a última relação entre em engrenagens antes do torque chegar as rodas, ou seja, além da redução ou desmultiplicação provida pela caixa de marcha, ainda há a redução pinhão-coroa do diferencial. Além disso, é naquele engrenamento que se altera o sentido de transmissão do torque, pois o pinhão e a coroa são engrenagens cônicas, e seu engate é exatamente em 90°, desviando o sentido do torque na mesma proporção.

Coroa

É uma engrenagem cônica, sua faixa dentada é disposta lateralmente, e nesta se engrena o pinhão, no qual recebe o torque do motor. A coroa é feita em aço (e o pinhão também), o número de dentes varia de acordo com o projeto do veículo, por exemplo, no caso da coroa ter 30 dentes e o pinhão 10. Isso significa que o pinhão gira três voltas, enquanto que as rodas giram apenas uma. A coroa também aloja a caixa do diferencial, portanto, ao girar, a coroa aciona as engrenagens satélites e planetárias, que transmitem o torque para as rodas.

Engrenagens satélites

Na foto é possível observar a caixa do diferencial, as engrenagens planetárias (maiores) e as satélites (menores).

São pequenas engrenagens cônicas fabricadas em aço alojadas na caixa do diferencial, geralmente em número de duas, as engrenagens satélites engrenam nas duas engrenagens planetárias. Além disso, são responsáveis pela distribuição de torque para as rodas, realizando a equalização entre estas, e possibilitando que o automóvel contorne curvas.

Engrenagens planetárias

Também são engrenagens cônicas, feitas em aço e dispostas em pares. As planetárias são as últimas engrenagens antes do torque chegar as rodas do veículo. Aquelas são montadas em seus suportes dentro da caixa do diferencial. As engrenagens planetárias se ligam as semi-árvores, estas se encaixam no centro daquelas, em seus estriados ou chavetas. Dessa forma o a semi-árvore recebe o torque motor e o transmite as rodas.

Caixa do diferencial

A caixa do diferencial é uma estrutura no qual estão todas as engrenagens do diferencial, mas apenas a coroa e as engrenagens satélites estão fixas na caixa. Portanto, a caixa do diferencial gira solidária a coroa, movimentando as engrenagens satélites e planetárias.

Tipos

Os tipos de diferenciais podem variar de acordo com o tipo de engrenagem cônica:

  1. Dentes retos;
  2. Helicoidais;
  3. Helicoidas hipoides.

O componente-chave para o funcionamento do diferencial chama-se engrenagem cônica, esta é assim chamada pois seu formato não é cilíndrico, e sim, na forma de tronco de cone. Os dentes podem ser retos ou helicoidais, e até mesmo hipóides. Elas são tão importantes, pois são capazes de alterar a direção do torque recebido pelo motor, através do pinhão, em 90°. Sua disposição dentro do diferencial é feita de forma cruzada, formando um ângulo de 90°. As engrenagens cônicas se ligam apenas as outras engrenagens do mesmo tipo.

Diferencial de dentes retos

Crédito foto: https://upload.wikimedia.org

Neste tipo de diferencial, as engrenagens utilizadas são cônicas de dentes retos. Embora estas sejam baratas para fabricar, são bastante ruidosas devido ao formato dos dentes, estes são retos e proporcionam, a cada engrenamento, um choque que causa sua aspereza de funcionamento, logo o seu ruído característico.

Diferencial de dentes helicoidais

Crédito foto: https://upload.wikimedia.org

Montado com engrenagens cônicas de dentes helicoidais, este tipo de diferencial substituiu quase que totalmente o diferencial anterior. Não apenas por ser mais suave de engrenamento e silencioso, mas por que os dentes helicoidais proporcionam às engrenagens um rendimento de 95% a 98%. Em seu engrenamento, possui maior número de dentes em contato com a outra engrenagem, favorecendo uma maior transmissão de torque. Sua suavidade de engrenamento é resultado do contato gradual entre os dentes, que reduz a aspereza dos choques quando em transferência de torque. Além disso, possuem um certo nível de flexibilidade, algo necessário nos diferenciais atuais.

Diferencial de engrenagens hipóides

Crédito foto: http://xlusi.com/

Os diferencias montados com engrenagens hipóides se diferenciam das helicoidais por vários fatores. O primeiro deles, a possibilidade de se montar o cardan abaixo da linha de eixo do diferencial, e assim o assoalho da carroceria não precisa do característico ressalto longitudinal que invade o habitáculo. Mas, além disso, diferenciais com engrenagens hipóides possibilitam o uso de pinhão maior, podendo trabalhar com uma taxa de redução mais elevada em relação as engrenagens cônicas helicoidais, além de desempenhar maior contato na coroa do diferencial. Portanto, transferindo maior torque para este. Neste caso, os dentes das engrenagens possuem forma hiperbolóide (forma de hipérbole). Esses diferenciais trabalham com certo nível de deslizamento, pois isso é uma características das engrenagens cônicas hipóides. Motivo pelo qual utilizam lubrificantes de alta performance. O uso de desse tipo de diferencial é voltado para aplicações nas quais o torque de acionamento é muito elevado.

Os diferenciais também variam de acordo com o seu bloqueio:

  1. Aberto – Open;
  2. Autobloqueante de embreagem – Limited Slip Differential (LSD);
  3. Autobloqueante Torsen – Torsen Limitid Slip Differential (LSD).

Diferencial Aberto

Crédito foto: http://www.off-road.com/
Crédito foto: http://www.off-road.com/

É o diferencial básico utilizado na maioria das aplicações automotivas, não dispõe de bloqueio algum deste. Portanto, quando uma das rodas motoras perde tração, o diferencial envia torque em duplicidade para aquela. Sendo então, este o seu ponto fraco.

Diferencial Autobloqueante de Embreagem

Visão explodida do diferencial LSD. É possível notar as dezenas de discos de embreagem com e sem dentes (Clutch Packs). Crédito foto: https://grassrootsmotorsports.com

É o tipo mais comum de diferencial LSD para aplicações automotivas. Neste, seus componentes são os mesmo do diferencial comum, exceto pelas duas embreagens localizadas entre a caixa do diferencial e as engrenagens planetárias, também chamadas de Clutch Packs. Estas embreagens possuem dois tipos de discos, montados em grande quantidade e intercalados entre si, o disco de atrito e o disco de aço. Os discos de atrito possuem dentes no sua extremidade interna, enquanto que os discos de aço possuem alguns poucos dentes na sua extremidade externa. Ambos são encaixados na parte traseira das engrenagens planetárias, que possuem dentes também, e nestes se encaixam os discos de atrito e de aço. Entre as engrenagens planetárias, há uma mola de pré-carga que empurra as engrenagens contra suas sedes, mas sem pressão suficiente para travar o diferencial.

Visão explodida e montada do Diferencial LSD. Crédito foto: http://www.nismo.co.jp/

Portanto, no contorno de curvas, o diferencial LSD funciona da mesma forma que um diferencial comum. Entretanto, quando uma das rodas de tração está em uma situação de baixo atrito, e a outra em boas condições de atrito, aquela gira em falso e tem transmissão limitada de torque. Enquanto que a outra precisa de um alto torque para girar, o diferencial naturalmente manda mais torque para essa roda. No engrenamento das planetárias com as satélites, ao começarem a girar, ambas satélites e planetárias exercem forças axiais sobre elas mesmas, essas forças serão maiores quanto maior for o torque necessário para fazer girar a roda. A força axial exercida pela satélite sobre a engrenagem planetária, empurra esta contra sua sede. Como a engrenagem planetária possui uma pequena folga no estriado da semi-árvore, esta força axial, somada com a força da mola, é capaz de empurrar a engrenagem planetária contra sua sede, comprimindo a embreagem que está nesta. Como os discos de aço possuem seus dentes encaixados em pontos da caixa do diferencial, ao comprimir a embreagem, o movimento da caixa do diferencial passa para a engrenagem planetária (neste ponto temos o efeito embreagem), o diferencial passa a transmitir mais torque para a roda que estiver com maior tração, enquanto que a outra terá torque limitado.

Diferencial Autobloqueante Torsen

Ring Gear: Coroa; Worm Gear: Engrenagem Helicoidal; Differential Case: Caixa do diferencial; Worm Wheel: Parafuso sem fim; Spur Gear: Engrenagem de Dentes. Axle shaft: Semi-árvore. Crédito foto: http://members.rennlist.com/

É uma variação do diferencial autobloqueante de embreagem, neste caso alguns componentes são diferentes e o principio também está um pouco alterado. No lugar de engrenagens planetárias e satélites, há um conjunto de engrenagens helicoidais e parafusos sem fim. Entretanto, este diferencial preserva a semelhança com os demais através do seu acionamento, também por pinhão e coroa. O pinhão aciona a coroa, e nesta está a caixa do diferencial, que aloja todas as engrenagens e parafusos sem fim. Quando a coroa gira, a caixa gira solidário a ela. As engrenagens helicoidais estão encaixadas no estriado das semi-árvores, engrenada naquelas estão os parafusos sem fim. Estes são alojados dentro da caixa do diferencial através de hastes, nas extremidades do parafuso sem fim estão engrenagens de dentes retos. Elas são responsáveis por manter os parafusos sem fim de cada lado, engrenados.

Diferencial LSD Torsen montado. Crédito foto: http://www.clublexus.com/

O conjunto engrenagem helicoidal e parafuso sem fim funciona através do giro da engrenagem helicoidal, esta é quem aciona o parafuso sem fim, para então girarem solidários. No caso do parafuso sem fim acionar a engrenagem helicoidal, o conjunto irá travar, ou seja, o parafuso sem fim não é capaz de acionar a engrenagem helicoidal. No momento em que o veículo começa a contornar uma curva, a roda interna à esta deve girar mais lentamente e a externa mais rapidamente. No diferencial Torsen isso é possível, mas além disso, a redução e o aumento de velocidade entre as rodas é proporcional. Ou seja, quando a engrenagem helicoidal gira, ela aciona o parafuso sem fim. Como ambos os lados estão conectados por engrenagens de dentes retos, quando uma roda reduz sua velocidade e a outra aumenta, isto ocorre na mesma proporção, ou seja, se uma aumenta 10% sua velocidade, a outra roda reduz 10% de sua velocidade.

Entretanto, a grande função do diferencial Torsen é o seu bloqueio, e este funciona da seguinte forma. Supomos uma situação na qual ambas as rodas estão sobre superfícies de diferentes coeficientes de atrito, é natural então que essas rodas tendam a girar em velocidades diferentes, ou seja, uma das rodas irá girar em falso e mais rapidamente. Essas situação com um diferencial padrão seria caracterizada com o posterior envio de todo o torque para a roda sem tração, mas com o Torsen, no momento em que a roda gira mais rápido em relação a outra, a engrenagem helicoidal respectiva aciona o seu parafuso sem fim. Lembrando que estes são dotados de engrenagens de dentes retos que ligam os parafusos sem fim de ambos os lados, temos então a transferência da rotação de parafuso sem fim para o outro, no caso do que está girando mais rápido para o mais lento. Como foi dito em parágrafos anteriores, um parafuso sem fim não pode ser o acionador do mecanismo, ele apenas pode ser o acionado, assim o mecanismo irá travar e a coroa passará acionar as duas rodas sem diferença de torque. Todo esse processo é realizado de forma instantânea no diferencial Torsen, fato este que o coloca em vantagem em relação ao diferencial LSD de embreagem. Além disso, o Torsen pode ter mais de um conjunto de parafusos sem fim para possibilitar grandes transferências de torque.

Funcionamento – Diferencial

Quando a árvore secundária da caixa de marchas gira com torque produzida pelo, ela também gira a árvore de transmissão. Através desta o torque reduzido ou desmultiplicado pela caixa de marcha alcança o pinhão do diferencial. Partindo do ponto que temos um automóvel parado no sinal. No momento em que este arranca, o pinhão do diferencial gira a coroa do diferencial, aqui aliás, temos o último ponto de redução antes do torque chegar as rodas. A coroa gira, solidaria a ela gira também a caixa do diferencial com suas engrenagens satélites. Neste momento as satélites estão girando conforme a coroa, sem executar movimento algum em relação a elas mesmas. Dessa forma as engrenagens planetárias giram, acionadas pelas satélites, a mesma velocidade e o automóvel ganha velocidade em linha reta sem patinação alguma. Entretanto, é chegado o momento deste automóvel contornar uma curva. O condutor freia, reduz as marchas e começa contornar a curva. O diferencial nesse momento, continua girando da mesma forma, exceto pelas engrenagens planetárias e satélites. Como as rodas do automóvel percorrem distâncias diferentes, estas giram a velocidades diferentes. Sendo as rodas internas, as mais lentas. Assim, a engrenagem planetária respectiva a roda mais lenta, gira, também, mais lentamente. Entretanto, o torque aplicado a coroa é o mesmo para ambos os lados, mas nesse momento a engrenagem satélite que aciona a planetária citada acima, passa gira sobre seu próprio eixo para compensar a menor velocidade da roda interna à curva. Dessa forma o diferencial permite que o automóvel seja capaz de contornar qualquer curva. Esse princípio é válido para qualquer diferencial.

Árvores, juntas e cardan

De nada adiantaria todo o trabalho do diferencial se não houvesse componentes que transmitissem o torque para as rodas de forma eficiente. Esses componentes são os eixos e os cardãs. A função desses componentes é transmitir o torque motor para o diferencial e deste para as rodas, mas permitindo o movimento da suspensão e da roda, compensando o deslocamento do cardã de acordo com o movimento do carro, e sempre suportando a reação do torque motor, que tende a torcer as árvores e o apoio destes.

Árvore de transmissão

Conjunto cambio, árvore de transmissão e diferencial. Percebe que nas extremidades da árvore de transmissão há juntas universais. Crédito foto: Livro do Automóvel.

Carros com tração nas rodas traseiras ou nas quatro rodas necessitam de um eixo longitudinal entre a caixa de marchas e o diferencial. A árvore de transmissão possui forma tubular, é rígida e inteiriça, fabricada em aço e projetada de forma que sua massa esteja o mais uniformemente distribuída ao longo desta, a isso chamamos de balanceamento e é necessário para reduzir vibrações incômodas. Nas extremidade da árvore de transmissão estão os cardãs, estes são juntas com o objetivo de permitir que a árvore de transmissão disponha de um certo ângulo de movimento para acompanhar o trabalho da suspensão traseira enquanto o veículo se desloca. Quando a suspensão do veículo trabalha, seja em movimento de subida ou de descida, a distância entre o eixo secundário da caixa de marchas e o diferencial aumenta, sendo necessária que o eixo de transmissão seja capaz de deslocar alguns milímetros para compensar esse aumento. Tanto o deslocamento do eixo de transmissão no sentido longitudinal, quanto radial é possível graças as juntas universais e elásticas.

Componentes

  1. Árvore;
  2. Juntas universais;
  3. Cruzetas.

Árvore

Árvore de transmissão com juntas universais. Crédito foto: http://www.magweldtech.com/

Feita em aço laminado, balanceado, e soldado eletricamente. Possui a função de transmitir o torque do motor para o diferencial com o máximo de suavidade. Uma de suas extremidades se liga a árvore secundária da caixa de marchas, e a outra ao diferencial. Nas duas extremidades há juntas universais, que conferem uma certa flexibilidade de movimento a este. Em aplicações da linha pesada e com grande distância entre-eixos, se verifica inviável utilizar uma longa árvore de transmissão para o veículo, pois as vibrações seriam amplificadas e o estresse sobre os rolamentos da árvore secundária da caixa de marchas e do pinhão do diferencial aumentariam. Para evitar esse inconveniente, utilizam-se pequenos eixos de transmissão articulados visando redução de massa oscilante, consequentemente a vibração excessiva.

Juntas universais

Crédito foto: http://www.flamingriver.com/

Estão localizadas nas extremidades da árvore de transmissão. Sua função é permitir que esta possa se deslocar para variar seu comprimento e seu ângulo de inclinação, e assim acompanhar os movimentos da suspensão, pois a árvore secundária da caixa de marchas e o pinhão do diferencial permanecem praticamente paralelos a linha de eixo dos mesmos.

Sliding Yoke: Garfo; Cross: Cruzeta; Tubular Shaft: Árvore de Transmissão; Bushing and Rollers: Rolamento com buchas; Seal and Retainer: Retentores; Bushing Retainer: Presilha; Crédito foto: http://arrc.ebscohost.com/

O movimento longitudinal da árvore de transmissão é possibilitado pelas estrias da árvore secundária, nestas se encaixa um dos garfos que compõe a junta universal. Este garfo gira solidário a árvore secundária, e está acoplado ao garfo da árvore de transmissão por intermédio da cruzeta, este une os dois garfos e é um elo importante na transmissão do torque do motor. É através da cruzeta que o movimento radial da árvore de transmissão é obtido.

Cruzetas

O cardã em si. A cruzeta é o componente que faz o papel principal na junta universal, possui forma de cruz, na qual em suas pontas se encaixam nos furos dos garfos. Cada garfo está disposto em 90° em relação ao outro, e é essa ligação do garfo com a cruzeta que possibilita a articulação do cardã, da junta universal. Uma junta universal é capaz de suportar até 40° de inclinação da árvore de transmissão em relação a suspensão traseira. Mas para ser tão eficiente, a cruzeta precisa lidar com o atrito no movimento relativo dos garfos quando encaixados na mesma. Para reduzir o atrito, a cruzeta é composta por alguns componentes, mas é importante mencionar, que a cruzeta em si é um grande graxeiro. Toda cruzeta possui uma graxeira, uma pequena válvula de esfera (normalmente fechada) por é onde a cruzeta é preenchida com graxa. A graxa possui a função de reduzir o atrito das articulações da cruzeta com os garfos, aquelas são providas de rolamentos em suas extremidades. Além disso, a graxa protege, também, contra oxidação dos componentes. O rolamento da cruzeta é mantido na mesma através de anéis trava, aquele é encaixado na cruzeta sobre retentores, que impedem o vazamento da graxa contida na cruzeta.

Funcionamento – Árvore de Transmissão

Quando o torque é reduzido ou desmultiplicado na caixa de marchas, esta fornece o binário na ponta de sua árvore secundária. A árvore de transmissão é acoplada à árvore secundária através de uma junta universal, capaz de permitir movimentos longitudinais e radiais daquela a medida que a suspensão se movimenta. No momento que selecionamos uma marcha e embreamos o carro, o torque é fornecido para a árvore de transmissão. Este gira solidário a árvore secundária. A outra extremidade da árvore de transmissão está ligada ao pinhão de engrenamento do diferencial, também através de uma junta universal, e pelo mesmo motivo. Com o motor funcionando, carro embreado, a árvore de transmissão gira transmitindo o torque da caixa de marchas para o diferencial. A medida que o automóvel trafega e passa por irregularidades no solo, a suspensão trabalha, e seus movimentos devem ser acompanhados pela árvore de transmissão. Os movimentos desta, embora curtos, são suficientes para impedir que qualquer movimento da suspensão venha a prejudicar a transmissão de torque para as rodas. São as juntas universais, dispostas em ambas as extremidades da árvore de transmissão, que garantem o movimento (curto, convenhamos) desta. A configuração da árvore de transmissão com juntas universais em cada extremidade é chamada Hotchkiss drive.

Semi-árvores e juntas homocinéticas

Caixa de cambio compacta, apenas a carcaça. Mas o que vemos na foto, também, é o alojamento do diferencial, perceba que o pinhão está no local.

Na busca por um powertrain mais compacto, as montadoras investiram seus projetos de carros no qual o powertrain é composto pela caixa de marchas do tipo compacta (leia mais). Esta caixa difere das tradicionais por englobar o diferencial e caixa de marcha em um mesmo conjunto. É utilizada em carros de grande produção, independente do seu nível de sofisticação. Assim, é dispensado o uso da árvore de transmissão, o conhecido eixo cardan explicado acima. Nesta configuração o que transmite torque as rodas são as semi-árvores. A princípio a semi-árvore pouco difere da árvore de transmissão utilizada em carros de powetrain dianteiro longitudinal. Mas ao invés de utilizar cardãs (juntas universais), aquela utiliza juntas homocinéticas, também chamadas de união homocinética Birfield. Mesmo assim, há casos em que se verifica a utilização de cruzetas em uniões homocinéticas. A semi-árvore é feita em aço assim como a árvore de transmissão, também dispõe de estrias em suas extremidades, pontos onde as juntas homocinéticas irão se encaixar. As juntas homocinéticas são encaixadas nas duas extremidades da semi-árvore, mas uma delas é aparafusada na flange da caixa de marchas, enquanto a outra recebe o cubo de roda. Esta última é chamada de ponta de eixo, no qual o cubo de roda é aparafusado com grande torque em sua porca.

Joint Housing: Invólucro; Cage: Grade; Hub: Aranha; Balls: Esferas; Boot: Coifa; Clamp: Abraçadeira; Axle Shaft: Semi-árvore; ABS Tone Ring: Roda fônica do ABS. Crédito foto: http://ww2.justanswer.com/

A juntas homocinéticas conseguem transmitir o torque do diferencial para a semi-árvore e desta para a roda, mesmo quando a suspensão está sobre severa flexão. Dentro da homocinética está um alojamento de esferas (também chamado de aranha), de forma cilíndrica, mas com furos onde são colocadas pequenas esferas de aço. Dentro do invólucro da junta homocinética também há espaços para as esferas, pelo que estes coincidem com os contidos na aranha. Ou seja, as esferas se encaixa na aranha, e esta só pode ser montada na junta em única posição. A aranha recebe a semi-árvore pelo furo central, que contém estrias.

Layout de montagem das semi-árvores em carros de motor transversal e tração dianteira.
Crédito foto: http://www.samarins.com/

Quando o diferencial manda o torque da caixa de cambio para o flange, este gira a junta homocinética interna, consequentemente a semi-árvore e a ponta de eixo. O que faz a homocinética funcionar são as esferas, elas quem realmente transmitem o torque recebido da semi-árvore, e não só isso, também permitem o movimento da semi-árvore com o sobe e desce, ou seja, acompanhando o movimento da suspensão.

Ponta de eixo. Crédito foto: http://www.carid.com/

Entretanto, assim como nos cardãs, esse movimento da junta homocinética logo a levaria a sua destruição devido o atrito gerado entre as esferas, aranha e a própria junta (invólucro). Da mesma forma que na junta universal, utiliza-se uma graxa especial para lubrificar os componentes internos e evitar o contato total entre os mesmos, além de proteger contra a oxidação. Lembrando que neste caso não há graxeira, utilizam-se coifas de borracha fixadas com abraçadeiras de metal, para impedir vazamento de graxa da junta. Assim está garantido o funcionamento perfeito da junta homocinética.

Semi-árvores em veículos de tração traseira

Semi-árvore traseira. Crédito foto: http://walcks4wd.com/

Para automóveis que utilizam sistema de transmissão com tração traseira, também há a utilização de semi-árvores. Entretanto, nesta aplicação observamos diferentes tipos de eixo traseiro. Existem o que chamamos de Eixo Morto e Eixo Vivo (Dead Axle e Live Axle). E veremos aqui, que há variações de configurações em eixos vivos (É assim chamado por que há torque sendo transmitido para ele) relacionadas à forma como as semi-árvores são apoiadas, pois neste caso não dispomos de cardans ou juntas homocinéticas. As formas de suporte das semi-árvores são classificadas como semi-flutuantes, flutuantes e três quartos de flutuantes. Essa classificação faz referência na posição de instalação dos rolamentos de apoio das semi-árvores, os rolamentos internos e externos. Tendo em mente que as semi-árvores se encaixam nas engrenagens planetárias do diferencial, e aquelas possuem seus pontos de apoio nas suas extremidades, fica claro que os rolamentos estão nas extremidades das semi-árvores e da bainha do diferencial.

Crédito foto: http://www.team-bhp.com/

Em apoios semi-flutuantes, os rolamentos de suporte são cônicos, e montados dentro da bainha do diferencial. As semi-árvores passam por dentro dos rolamentos e nestes se apoiam, tendo o suporte necessário para flexionarem sustentar o peso do veículo. Apoios flutuantes dispõe de rolamentos de esferas, sendo o interno contido dentro da bainha do diferencial e o externo disposto em volta da bainha do diferencial, ou seja, as semi-árvores são montadas passando por dentro do rolamento interno, enquanto que no rolamento externo, ambas semi-árvores e bainha do diferencial passam por dentro do rolamento. O apoio três quartos de flutuante também de dispõe de um rolamento na bainha do diferencial, mas no lado interno deste. O rolamento externo encontra-se entre o cubo de roda e a bainha do diferencial.

Manutenção

Diferencial danificado por montagem com procedimentos incorretos. Neste caso, pinhão e coroa devem ser substituídos.

O diferencial é um componente projetado por durar longas e severas horas de trabalho, caro e pesado, assim como a caixa de cambio, aquele não pode ser um componente em que suas peças tenham substituições por manutenção preventiva, pois estas são caras para se projetar e fabricar. Entretanto o diferencial não funciona a seco, este possui um óleo lubrificante, que deve ser verificado com alguma periodicidade, o fabricante informa no manual do proprietário quais ações devemos tomar em relação ao óleo lubrificante do diferencial, ou seja, se devemos efetuar a troca ou apenas uma análise. Neste último caso, o objetivo é verificar se há excesso de limalhas de aço, que se desprendem das engrenagens devido ao desgaste natural destas. Para garantir que o óleo do diferencial não vase, retentores e juntas a base de silicone se encarregam de vedar o diferencial, mas quandos estes não o fasem, temos o vazamento. O vazamento de óleo gradativamente reduz o nível deste, com isso as engrenagem passam a trabalhar mais a seco, o atrito entre elas aumenta, sua temperatura e consequentemente o desgaste. Isso é percebido através do funcionamento do diferencial, que se dá de forma ruidosa, ruído este que chamamos de roncado. Neste caso não há mais soluções, a não ser a substituição completa das engrenagens. Contudo, ruídos na transmissão de torque também podem ser atribuídos a árvore de transmissão ou às semi-árvores, pois durante o funcionamentos as juntas universais e homocinéticas podem estar desgastadas e por fim acabarem sendo causadoras de ruídos e estalos. Estes acontecem por que as juntas não conseguem acompanhar os movimentos da suspensão, fazendo com que as árvores de transmissão e semi-árvores trabalhem em ângulos fora do especificado. Assim como nos diferenciais, as juntas universal e homocinética possuem necessidade de lubrificação, e como já é de conhecimento, a falta desta implica em desgaste prematuro dos rolamentos nas juntas universais e da própria junta homocinética. Nas juntas universais é interessante verificar as cruzetas periodicamente quanto a graxa contida nas mesmas, enquanto que nas juntas homocinética se verifica o estado da coifa e de sua braçadeira. Em caso de vazamento por uma coifa rasgada ou abraçadeira defeituosa, procede a substituição destes e da graxa contida dentro da junta homocinética.

Referências

  • GENTA, Giancarlo, MORELLO, Lorenzo, The Automotive Chassis Volume 1 Components Design, Torino, Editora Springer, 2009. 633p;
  • HEISSING, Bernd, ERSOY, Metin. Chassis Handbook – Fundamentals, Driving Dynamics, Components, Mechatronics, Perspectives, Germany, Vieweg+Teubner, 2011. 591p;
  • SENAI, Série Metódica Ocupacional;
  • BOSCH, Robert, Manual de Tecnologia Automotiva. 25.ed. Edgard Blücher LTDA, 2004. 1231p;
  • Livro do Automóvel, Seleções do Readers Digest, 1978.