Fundamentos dos modelos matemáticos de pneus – Parte 3

A Figura da capa ilustra que a pegada é uma função de, pelo menos, FZ, α e t. No entanto, o ângulo de escorregamento α no pico de aderência é uma função FZ. Isso é um pouco não intuitivo, porque o pico de deslizamento ocorre em μk, que é menor que μs. O potencial não utilizado é maior que a quantidade perdida quando o pneu passa de μs para μk. Além disso, devido à distribuição FZ e ao fato de o atrito ser uma propriedade local, a aderência é um parâmetro de terceira ordem. Portanto, o pico de aderência não é μk*FZ nem μs*FZ. Em vez disso, é:

FIGURA 1 – Pico de força lateral.

A parcela de aderência que se ganha é maior que a que se perde quando se passa de μs para μk, como pode ser visto na Figura 2:

FIgura 2 – O máximo de força lateral engloba uma área maior.

Essa transição ocorre ao longo do comprimento do patch de contato. Em algum ponto, o patch de contato está escorregando e deslizando. Esta é a melhor condição, pois o maior coeficiente de atrito não é nem no escorregamento nem no deslizamento e a força produzida é maior do que nestas condições. Isso é confirmado pela fórmula FYmax na Figura 1.

FIGURA 3

A Figura 3 ilustra uma situação comum onde uma Força F é aplicada e uma força de atrito ƒ é gerada. Enquanto a relação entre eles é linear, F é igual a ƒ. No entanto, quando F atinge um valor limite, ocorre um colapso e reduz a uma condição inferior. Os valores de transição entre essas fases (Figura 4) são os dados pela Figura 1.

FIGURA 4

Assim, é possível resumir algumas conclusões sobre a força de atrito obtida durante a operação do pneu:

FIGURA 5

Portanto, um pneu produz seu FY máximo quando trabalha em uma condição crítica que não é caracterizada por μk*FZ nem μs*FZ. Em vez disso, é algo entre esses dois, que é definido por μs, χ e FZ. Além disso, a área de contato está totalmente sob deslizamento. Quando FZ aumenta ainda mais, o atrito diminui e a carga lateral diminui para μk*FZ.

Distribuição de tensão de patch de contato

FIGURA 6

A Figura 6 ilustra que existe uma conexão direta entre a rigidez em curva CS e a área de contato do pneu. É possível ter dois pneus, um estreito e outro largo e estes têm a mesma área de contato. Além disso, esses pneus são submetidos ao mesmo ângulo de derrapagem e possuem a mesma construção. Como a rigidez em curva é dada pela equação acima, o principal parâmetro relativo à área de contato é o seu comprimento, portanto esses pneus terão CS diferentes, o que significa que para um mesmo α, eles geram aderência diferente. Assim, o pneu mais largo tem que realizar um α maior para produzir o mesmo FY do que o pneu mais estreito. Na verdade, a diferença entre as dimensões dos pneus vai além do CS. Pneus mais largos geralmente são mais sensíveis à variação de cambagem do que os estreitos. No entanto, pneus estreitos têm mais deformação da área de contato para compensar o ângulo de cambagem γ. Na verdade, a área de contato de um pneu curvo não é quadrada, mas sim trapezoidal. Por esse motivo, os pneus com curvatura dirigem naturalmente, pois sempre há um componente de velocidade lateral (Figura 7).

FIGURA 7 – Efeitos do ângulo de camber vão muito além de uma inclinação em relação ao eixo vertical da roda.

Isso resulta em Vy devido a γ. Esta componente é adicionada a α devido à força lateral produzida. Porém, o componente de γ age de forma diferente, cria um momento que faz o pneu virar naturalmente (Figura 8).

FIGURA 8

Por fim, é possível entender que a curvatura tem algum acréscimo na força lateral. A quantidade de Fy pode variar de acordo com o tipo do pneu. Em geral, a relação entre curvatura e rigidez nas curvas é maior para os pneus diagonais (cross-ply) do que para os radiais, 1/6 contra 1/20, respectivamente.

FIGURA 9

A mancha de contato trapezoidal ocorre devido à curvatura. Por exemplo, pneus usados em corridas ovais têm suas paredes laterais expostas a diferentes tensões. A parede lateral interna tem um material mais macio em relação à parede lateral externa. Consequentemente, esta é mais complacente, porque as cargas são menores e, portanto, as tensões também.

Cargas longitudinais

FIGURA 10

As cargas longitudinais são expostas à mesma teoria sobre os movimentos das cerdas. Como se pode observar, existem duas zonas ao longo da linha de contato (o modelo de cerdas reduz a área de contato a uma linha), a de adesão e a de deslizamento. Se fosse possível acompanhar uma cerda, seria possível visualizar sua deformação durante o movimento até seu desprendimento. Na Figura 10a, a cerda está presa à superfície e não apresenta deformação. À medida que o pneu gira, ele se deforma cada vez mais, como pode ser visto nas Figuras 10b e 10c. Porém, em algum momento, a ponta da cerda passa da condição de adesão para a condição de deslizamento. Nesse caso, a cerda continua a se deformar, mas o pneu gira mais e a ponta da cerda se desprende da superfície.

FIGURA 11

Entendendo que o pneu está exposto a condições de aderência e deslizamento, quando o pneu está sob cargas combinadas, FY e FX juntas, a força total produzida pelo pneu é uma combinação de aderência e deslizamento. No entanto, esta condição não está presente no início. O pneu está basicamente em estado de adesão no início do movimento. À medida que as cargas aumentam, algumas cerdas entram na condição de deslizamento, como pode ser visto na Figura 11a. À medida que a força total aumenta, o coeficiente de deslizamento σ varia de 0,04 a 0,26. No entanto, a carga tangencial máxima ocorre quando σ é 0,20. O pico de força total é obtido nesta condição, pois estas são ocupadas sob as duas curvas (Figura 11c). Quando as cargas aumentam, σ aumenta, mas agora μ vai para μk. A energia produzida no contato agora está sob a força de atrito cinético, que é a menor (Figura 11d).

FIGURA 12

Os principais movimentos longitudinais são rolamento livre, aceleração e frenagem. A primeira é caracterizada pelo fato de que o raio de rolamento é igual ao raio da roda. Além disso, Vsx é zero, porque não há escorregamento. No caso dos movimentos de aceleração e travagem, existe algum deslize. Portanto, re é diferente de r e Vsx é diferente de zero. O deslizamento resulta na chamada deflexão longitudinal, dada pelas equações e fórmulas acima (Figura 12). No entanto, é interessante expandir essa informação em termos dos coeficientes de deslizamento σχ e σy e correlacioná-los com o parâmetro composto do pneu θy:

FIGURA 13

A rigidez lateral cp é a única diferença entre θx e θy, que é essencialmente as características da cinta, onde cpx e cpy são a rigidez longitudinal e lateral, respectivamente. Em condições reais, cƒx é aproximadamente 1,5∙cƒy. Isso ocorre porque os pneus são anisotrópicos. Eles devem lidar com forças longitudinais e laterais. Além disso, devido a uma banda de rodagem arredondada de 90° e a grande preocupação em mantê-la o mais plana e em contato possível com a superfície. As paredes laterais e as lonas são construídas para gerar isso. Assim, a consequência é que cƒx = 1,5∙cƒy. A situação muda quando os pneus estão realizando movimentos que geram baixos níveis de deformações, portanto as equações da Figura 14 devem ser atualizadas:

FIGURA 14

Como pode ser visto, neste caso, o deslizamento longitudinal k e o ângulo de deslizamento α são tão pequenos, que a deflexão longitudinal e lateral são reduzidas à diferença entre a e x vezes o parâmetro de deslizamento respectivo a esses movimentos, σχ ou σy .

Deslizamento combinado

FIGURA 15

O deslizamento combinado é uma situação em que ambas as cargas laterais e longitudinais estão ocorrendo ao mesmo tempo. Nestes casos o efeito de σχ e α são ainda mais importantes. As equações para este caso já foram descritas nas Figuras 12, 13 e 14, mas quando combinadas com o sistema de equações ficam assim caracterizadas por vetores e matrizes que diferem conforme a situação da área de contato do pneu, aderência ou deslizamento. No primeiro caso pode-se escrever:

FIGURA 16

Como pode ser visto na Figura 16, no caso de adesão o vetor e é simplificado, pois não há escorregamento, assim os termos referentes a velocidade relativa e raio são desprezados e iguais ao valor nominal, respectivamente. Além disso, é possível dividir os componentes longitudinais e laterais do termo de deflexão combinado e. Basicamente e é igual ao quadrado da soma entre u e v (Figura 16). No caso da condição da área de contato do pneu deslizante, pode-se escrever:

FIGURA 17

Portanto, a condição de deslizamento no deslizamento combinado (Figura 17) do modelo brush é dependente de FZ e µ. Além disso, a razão entre o coeficiente de deslizamento teórico total e os laterais ou longitudinais define a tensão local produzida durante o movimento de deslizamento combinado (Figura 17).

FIGURA 18

Por fim, com essas equações (Figura 17) é possível visualizar os efeitos da razão de escorregamento longitudinal k e do ângulo de escorregamento α nas cargas da roda principal, FY, FX e MZ. Fixando θ igual a 5, é possível notar que durante a frenagem ou condução, quando o FY é aplicado, os efeitos principais vêm de α . Entretanto, se k mudar de valores distantes de zero, o que representa situação de frenagem ou direção, FY reduz drasticamente mesmo que α seja um valor ideal. Há outro detalhe que é melhor observar no círculo de atrito (gráfico à direita da Figura 18). O lado da frenagem tem um raio maior em relação ao lado da direção. Os carros produzem mais força longitudinal ao frear devido ao arrasto e à transferência de carga. Esses fatores aumentam o FZ do pneu dianteiro e, portanto, sua aderência. Por esta razão é normal observar que para um mesmo módulo da razão de escorregamento longitudinal k, durante a frenagem da colheitadeira, o FY é maior. As linhas de α constante formam elipses que são mais deformadas no lado da frenagem devido a k. Em todos os casos, o aumento de α produz mais FY, mas à medida que k aumenta, seja freando ou dirigindo, essa capacidade de produzir FY diminui. Portanto, este é o motivo pelo qual é possível curvar durante uma frenagem forte, enquanto o mesmo deslizamento combinado para dirigir gera uma capacidade de curva reduzida (Figura 18).

FIGURA 19

A função do ângulo de direção para manter o carro em equilíbrio. O manuseio é ajustado pelas pastilhas de aceleração e frenagem. O motorista exige que o volante equilibre as condições devido ao acelerador ou às entradas do pedal de freio. A principal razão para este fenômeno é que a transferência de carga longitudinal ocorre em uma velocidade muito maior do que a transferência de carga lateral. Portanto, a velocidade com que o motorista aciona ou desativa o acelerador ou o pedal do freio é fundamental para definir qual é o ângulo de esterço ideal para aquela situação. Além disso, a sobreviragem e a subviragem são uma consequência das entradas do motorista. Portanto, a condição de equilíbrio pode ser o comportamento de subviragem ou sobreviragem do carro. A velocidade de liberação da frenagem ajusta a carga vertical nos pneus dianteiros. Portanto, as habilidades de frenagem do motorista são a principal técnica para definir o manuseio. Em outras palavras, se o motorista exigir mais FX, os pneus entregarão menos FY.

Referências

  • Race Car Vehicle Dynamics – Miliken & Miliken;
  • Guiggiani, Massimo. The Science of Vehicle Dynamics. Handling, Braking, and Ride of Road and Race Cars. New York, Springer, 2014;
  • Haney, Paul. The Racing & High-Performance Tire – Using the Tires to Tune for Grip & Balance. TV Motorsports, SAE, January, 2003.